domingo, 10 de novembro de 2019

Espiritismo e Humboldt

Na revista Veja de nº 2493, de 31 de agosto de 2016, tem uma matéria que fala sobre um grande cientista da história humana. A reportagem é assinada por Filipi Vilicic, que narra a ”biografia excepcional que conta as viagens e descobertas do alemão Alexander Von Humboldt (1769-1859), o cientista que definiu a ideia de ecologia e influenciou intelectuais e estadistas”. Entre as suas obras, pesquisas, viagens etc, destaca-se, na reportagem citada, expedições a várias partes do planeta, passando desde a América do Sul, Central e América do Norte, indo até a Ásia. Publicações de livros como Ensaio sobre a Geografia das Plantas, Viagem às Regiões Equinociais do Novo Continente, Narrativa Pessoal, Kosmos, entre outros. Foi amigo de Thomas Jefferson, Napoleão Bonaparte, Simón Bolivar. Escrevia cartas a vários intelectuais da época, por medo de morrer em campo. Ele preconizou o aquecimento global ao afirmar que o desmatamento e gases emitidos pelas nascentes indústrias modificariam o clima terrestre. Tinha a tese de que o planeta e todo o cosmo é uma unidade composta de interconexões. O naturalista chegou a visão de que cada planta e cada animal, ao lado de fatores como temperatura e umidade, determinam o equilíbrio dos ecossistemas. Escalou o vulcão Chimborazo, no Equador, então tido como a mais alta montanha da Terra. Ao olhar a natureza de cima, Humboldt concluiu que todos os elementos são interconectados, antecipando a Teoria de Gaia, de James Lovelock. Sua obra é vastíssiima, e essas poucas linhas não preenche 1%. O repórter diz que ele queimou a sua fortuna financiando viagens, por ser filho de um militar e de uma rica herdeira de um industrial.
Se você prestou atenção no ano de sua desencarnação, perceberá que foi 2 anos após a publicação do Livro dos Espíritos de Allan Kardec. E na Revista Espírita de 1859, em junho, há um texto interessantíssimo sobre um certo Humboldt. Transcrevo aqui as perguntas na íntegra para vossa apreciação. São 26 perguntas e observações importantes.
São Luís era o Patrono Espiritual da Sociedade Parisiense de Estudos Psicológicos e Arago era um dos Espíritos comunicantes.

ESPÍRITO ALEXANDRE DE HUMBOLDT

Falecido em 6 de maio de 1859; evocado na Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas nos dias 13 e 20 do mesmo mês.

[A São Luís] – Poderíamos evocar o Espírito Alexandre de Humboldt, que acaba de falecer?
Resp. – Se quiserdes, amigos.

1. Evocação.
Resp. – Eis-me aqui. Como isto me espanta!

2. Por que isto vos espanta?
Resp. – Estou longe do que era, há apenas alguns dias.

3. Se vos pudéssemos ver, como seríeis visto?
Resp. – Como homem.

4. Nosso chamado vos contraria?
Resp. – Não.

5. Tivestes consciência de vosso novo estado logo após a morte?
Resp. – Eu a esperava há muito tempo.

Observação – Entre homens que, como o Sr. Humboldt, morrem de morte natural, pela extinção gradual das forças vitais, o Espírito se reconhece muito mais prontamente do que naqueles em que a vida é bruscamente interrompida por um acidente ou morte violenta, posto já existir um começo de desprendimento antes de cessar a vida orgânica. No Sr. Humboldt a superioridade do Espírito e a elevação dos pensamentos facilitaram esse
desprendimento, sempre mais lento e mais penoso naqueles cuja vida é inteiramente material.

6. Tendes saudades da vida terrestre?
Resp. – Não, absolutamente. Sinto-me feliz; não me vejo mais na prisão; meu Espírito é livre... Que alegria! E que doce momento me trouxe esta nova graça de Deus!

7. Que pensais da estátua que vos será erigida na França, embora sejais estrangeiro?
Resp. – Meus agradecimentos pessoais pela honra que me é feita. O que sobretudo aprecio em tudo isso é o sentimento de união que o fato demonstra, o desejo de ver extintos todos os ódios.

8. Vossas crenças mudaram?
Resp. – Sim, muito. Mas ainda não revi tudo. Esperai um pouco, antes de me falardes com mais profundidade.

Observação – Esta resposta e o termo revi são característicos do estado em que ele se encontra. Apesar do pronto desprendimento de seu Espírito, existe ainda certa confusão de idéias. Havendo deixado o corpo apenas há oito dias, ainda não teve tempo de comparar suas idéias terrestres com as que pode ter
atualmente.

9. Estais satisfeito com o emprego que fizestes de vossa existência terrena?
Resp. – Sim. Cumpri mais ou menos o objetivo a que me propus. Servi à Humanidade, razão por que hoje sou feliz.

10. Quando vos propusestes este objetivo?
Resp. – Ao vir para Terra.

Observação – Desde que se propôs um objetivo ao vir à Terra, é porque tinha realizado um progresso anterior e sua alma não nascera ao mesmo tempo que o corpo. Essa resposta espontânea não pode ter sido provocada pela natureza da pergunta ou pelo pensamento do interlocutor.

11. Escolhestes esta existência terrena?
Resp. – Havia numerosos candidatos a esta obra; roguei ao Ser por excelência que ma concedesse, e a obtive.

12. Lembrais da existência que precedeu a que acabais de deixar?
Resp. – Sim; ela se passou longe de vós, num mundo muito diferente da Terra.

13. Esse mundo é igual, inferior ou superior à Terra?
Resp. – Desculpai; é superior.

14. Sabemos que nosso mundo está longe da perfeição e, conseqüentemente, não nos sentimos humilhados por haver outros acima de nós. Mas, então, como viestes a um mundo inferior àquele que habitáveis?
Resp. – Não damos aos ricos? Eu quis dar; por isso desci à cabana do pobre.

15. Poderíeis dar-nos uma descrição dos seres animados do mundo em que habitáveis?
Resp. – Ao vos falar há pouco, tinha esse desejo; mas compreendi, em tempo, que teria dificuldade de vo-lo explicar perfeitamente. Ali os seres são bons, muito bons; já compreendeis esse ponto, que é a base de todo o resto do sistema moral naqueles mundos: nada ali entrava o desenvolvimento dos bons
pensamentos; nada lembra os maus; tudo é felicidade, porquanto cada um está contente consigo mesmo e com todos os que o cercam. Em relação à matéria e aos sentidos, qualquer descrição seria inútil. Que simplificação na engrenagem de uma sociedade! Hoje, que me acho em condição de comparar as duas, surpreendo-me com a distância. Não penseis que assim falo para vos
desanimar; não, muito ao contrário. É necessário que o vosso Espírito fique bem convencido da existência de tais mundos; então sentireis um ardente desejo de os alcançar e o trabalho vos abrirá o caminho.

16. Esse mundo faz parte do nosso sistema planetário?
Resp. – Sim; está muito próximo de vós. Entretanto, não podeis vê-lo, porque não tem luz própria e não recebe nem reflete a luz dos sóis que o rodeiam.

17. Há pouco havíeis dito que vossa precedente existência se passara longe de nós e agora dizeis que esse mundo é muito próximo. Como conciliar as duas coisas?
Resp. – Considerando-se as vossas distâncias e medidas terrenas, ele está longe de vós. Se, entretanto, tomardes o compasso de Deus e, num volver de olhos, tentardes abranger toda a Criação, estará próximo.

Observação – Evidentemente podemos considerá-lo longe se tomarmos como termo de comparação as dimensões de nosso globo; mas está perto em relação aos mundos que se encontram a distâncias incalculáveis.

18. Poderíeis precisar a região do espaço em que se acha esse mundo?
Resp. – É inútil. Os astrônomos jamais a conhecerão.

19. A densidade desse mundo è idêntica à do nosso globo?
Resp. – A proporção é infinitamente menor.

20. Seria esse mundo da natureza dos cometas?
Resp. – Não; absolutamente.

21. Se não tem luz própria, e não recebe nem reflete a luz solar, nele reinará uma perpétua escuridão?
Resp. – Os seres que lá vivem não necessitam absolutamente de luz; a obscuridade não existe para eles; não a compreendem. Pensaríeis, caso fôsseis cegos, que ninguém pudesse dispor do sentido da visão?

22. Conforme certos Espíritos, o planeta Júpiter é muito superior à Terra; isso é exato?
Resp. – Sim; tudo quanto vos disseram é verdade.

23. Revistes Arago depois que voltastes ao mundo dos Espíritos?
Resp. – É ele que me estendeu a mão quando deixei o vosso.

24. Em vida conhecestes o Espiritismo?
Resp. – O Espiritismo, não; o magnetismo, sim.

25. Qual a vossa opinião sobre o futuro do Espiritismo entre as corporações científicas?
Resp. – Grande; mas seu caminho será penoso.

26. Pensais seja ele aceito algum dia pelas organizações científicas?
Resp. – Certamente. Acreditais, entretanto, que isso seja indispensável? Ocupai-vos, antes de tudo, em inocular os seus primeiros preceitos no coração dos infelizes que enchem o vosso mundo: é o bálsamo que acalma os desesperos e dá esperança.   

Referëncias

KARDEC, A. Revista Espírita. 1859. Federação Espírita Brasileira. Tradução de Evandro Noleto Bezerra.

Disponível em https://pt.wikipedia.org/wiki/Alexander_von_Humboldt Acessado em 28 dez. 2016.


VEJA, Revista. Edição 2.493. ano 49, nº 35. 31 de agosto de 2016. Pag. 88 – 91.

A lição dos chuchus


A lição dos chuchus

Dona Maria Pena, que era viúva do Raimundo, irmão do Chico, julgava que este era um mão aberta...

Não era muito crente do dar sem receber. E, certa manhã, em que, sobremodo, sentia a missão do Médium, que muito estimava, disse-lhe:

- Chico, não acredito muito nas suas teorias de servir, de ajudar, de dar e dar sempre, sem uma recompensa. Não vejo nada que você recebe em troca do que faz, do que dá, do que realiza...

- Mas, tudo quanto fazemos com sinceridade e amor no coração, Deus abençoa. E, sempre que distribuímos, que damos com a direita sem a esquerda ver, fazermos uma boa ação e, mais cedo ou mais tarde, receberemos a resposta do Pai. Pode crer que quem faz o bem, além de viver no bem, colhe o bem.

- Então, vamos experimentar. Tenho aqui dois chuchus. Se alguém aqui aparecer, vou lhos dar e quero ver se, depois, recebo outros dois...

Ainda bem não acabara de falar, quando a vizinha do lado esquerdo, pelo muro, chama:

- Dona Maria, pode me dar ou emprestar uns dois chuchus?

- Pois não, minha amiga, aqui os tem, faça deles um bom guisado.

Daí a instante, sem que pudesse refazer-se da surpresa que tivera, a vizinha do lado direito, também pelo muro, ofereceu quatro chuchus a Dona Maria.

Meia hora depois, a vizinha dos fundos pede a Dona Maria uns chuchus e esta a presenteia com os quatro que ganhara.

A vizinha da frente, quase em seguida, sem que soubesse o que acontecia, oferece à cunhada do nosso querido Médium, oito chuchus.

Por fim, já sentindo a lição e agindo seriamente, Dona Maria é visitada por uma amiga de poucos recursos econômicos.

Demora-se um pouco, o tempo bastante para desabafar sua pobreza.

À saída, recebe, com outros mantimentos, os oito chuchus...

E Dona Maria diz para o Chico:

- Agora quero ver se ganho dezesseis chuchus, era só o que faltava para completar essa brincadeira...

Já era tarde.

Estava na hora de regressar ao serviço e Chico partiu, tendo antes enviado à prezada irmã um  sorriso amigo e confiante, como a dizer-lhe:  - “Espere e verá”.

Aí pelas dezoito horas, regressou o Chico à casa.

Nada havia sucedido com relação aos chuchus...

Dona Maria olhava para o Chico com ar de quem queria dizer: “Ganhei ou não?...” 

Às vinte horas, todos na sala, juntamente com o Chico, conversam e nem se lembram mais do caso dos chuchus, quando alguém bate à porta.

Dona Maria atende.

Era um senhor idoso, residente na roça.

Trazia no seu burrinho uns pequenos presentes para Dona Maria, em retribuição às refeições que sempre lhe dá, quando vem à cidade.

Colocou à porta um pequeno saco.

Dona Maria abre-o nervosa e curiosamente.

Estava repleto de chuchus...

Contou-os: sessenta e quatro: Oito vezes mais do que havia, ultimamente, dado...

Era demais...

A graça, em forma de lição, excedia à expectativa, era mais do que esperava.

E, daí por diante, Dona Maria compreendeu que aquele que dá recebe sempre mais.

Fonte:
Lindos casos de Chico Xavier. Ramiro Gama. Ilustrações de Miranda Junior – 19ª edição – São Paulo, LAKE – 2000.

domingo, 3 de novembro de 2019

O mal e o remédio


Evangelho segundo o Espiritismo

Capítulo V – Bem-Aventurados os Aflitos

O mal e o remédio

19. Será a Terra um lugar de gozo, um paraíso de delícias? Já não ressoa mais aos vossos ouvidos a voz do profeta? Não proclamou ele que haveria prantos e ranger de dentes para os que nascessem nesse vale de dores? Esperai, pois, todos vós que aí viveis, causticantes lágrimas e amargo sofrer e, por mais agudas e profundas sejam as vossas dores, volvei o olhar para o Céu e bendizei do Senhor por ter querido experimentar-vos... Ó homens! dar-se-á não reconheçais o poder do vosso Senhor, senão quando ele vos haja curado as chagas do corpo e coroado de beatitude e ventura os vossos dias? Dar-se-á não reconheçais o seu amor, senão quando vos tenha adornado o corpo de todas as glórias e lhe haja restituído o brilho e a brancura? Imitai aquele que vos foi dado para exemplo. Tendo chegado ao último grau da abjeção e da miséria, deitado sobre uma estrumeira, disse ele a Deus: "Senhor, conheci todos os deleites da opulência e me reduzistes à mais absoluta miséria; obrigado, obrigado, meu Deus, por haverdes querido experimentar o vosso servo!" Até quando os vossos olhares se deterão nos horizontes que a morte limita? Quando, afinal, vossa alma se decidirá a lançar-se para além dos limites de um túmulo? Houvésseis de chorar e sofrer a vida inteira, que seria isso, a par da eterna glória reservada ao que tenha sofrido a prova com fé, amor e resignação? Buscai consolações para os vossos males no porvir que Deus vos prepara e procurai-lhe a causa no passado. E vós, que mais sofreis, considerai-vos os afortunados da Terra. Como desencarnados, quando pairáveis no Espaço, escolhestes as vossas provas, julgando-vos bastante fortes para as suportar. Por que agora murmurar? Vós, que pedistes a riqueza e a glória, queríeis sustentar luta com a tentação e vencê-la. Vós, que pedistes para lutar de corpo e espírito contra o mal moral e físico, sabíeis que quanto mais forte fosse a prova, tanto mais gloriosa a vitória e que, se triunfásseis, embora devesse o vosso corpo parar numa estrumeira, dele, ao morrer, se desprenderia uma alma de rutilante alvura e purificada pelo batismo da expiação e do sofrimento. Que remédio, então, prescrever aos atacados de obsessões cruéis e de cruciantes males? Só um é infalível: a fé, o apelo ao Céu. Se, na maior acerbidade dos vossos sofrimentos, entoardes hinos ao Senhor, o anjo, à vossa cabeceira, com a mão vos apontará o sinal da salvação e o lugar que um dia ocupareis... A fé é o remédio seguro do sofrimento; mostra sempre os horizontes do infinito diante dos quais se esvaem os poucos dias brumosos do presente. Não nos pergunteis, portanto, qual o remédio para curar tal úlcera ou tal chaga, para tal tentação ou tal prova. Lembrai-vos de que aquele que crê é forte pelo remédio da fé e que aquele que duvida um instante da sua eficácia é imediatamente punido, porque logo sente as pungitivas angústias da aflição. O Senhor apôs o seu selo em todos os que nele crêem. O Cristo vos disse que com a fé se transportam montanhas e eu vos digo que aquele que sofre e tem a fé por amparo ficara sob a sua égide e não mais sofrerá. Os momentos das mais fortes dores lhe serão as primeiras notas alegres da eternidade. Sua alma se desprenderá de tal maneira do corpo, que, enquanto se estorcer em convulsões, ela planará nas regiões celestes, entoando, com os anjos, hinos de reconhecimento e de glória ao Senhor. Ditosos os que sofrem e choram! Alegres estejam suas almas, porque Deus as cumulará de bem-aventuranças. - Santo Agostinho. (Paris, 1863.)

Fonte: KARDEC, ALLAN. O Evangelho segundo o Espiritismo. Tradução de Tradução de GUILLON RIBEIRO, 3a. edição francesa revista, corrigida e modificada pelo autor em 1866. 112ª Ed. FEB, Rio de Janeiro, 1944. 435 p.