O caminho da Paz Duradoura
(Da entrevista concedida a Fenelon Almeida e publicada pelo
jornal “O Povo”, de Fortaleza, Ceará, em 09.03.81)
P – A seu ver, qual o caminho que pode levar as nações a um
entendimento satisfatório, e, conseqüentemente, a uma paz duradoura?
- Creio que quando
cada um de nós estiver cumprindo os deveres que nos competem, perante Deus e
diante da vida, à frente dos outros e ante a nossa própria consciência,
alcançaremos a paz duradoura. Sobre essa questão de solucionarmos os grandes
problemas da comunidade, na base do esforço ou do sacrifício possíveis a cada
um, temos o exemplo inesquecível do Ceará, na abolição do cativeiro em nosso
País. Há mais ou menos um século, segundo acredito, o jangadeiro Francisco José
do Nascimento, revoltado contra a escravidão, gritou na praia de Fortaleza: “Em
minha jangada não mais aceitarei escravo algum, nem de bordo para a terra e nem
de terra para bordo”. Outros jangadeiros, todos eles brasileiros simples e
profundamente humanos, seguiram-lhes as normas. Naturalmente sofreram eles
prejuízos consideráveis, abstendo-se de angariar ou aceitar fretes que lhes
eram necessários à subsistência, mas sustentaram a própria palavra e a abolição
na Província do Ceará começou com o exemplo dos humildes, conquistando corações
em todas as classes sociais. Quando José do Patrocínio visitou a cidade de
Fortaleza, em 1882, já encontrou clima perfeito destinado a basear a libertação
dos nossos irmãos cativos. Todo o Ceará já possuía nobres figuras de homens
dignos empenhados na libertação dos escravos, mas comoveu-se toda a Fortaleza
com a pregação do admirável abolicionista. E os frutos da sementeira de
Francisco José do Nascimento começaram a surgir. Se não me engano, em
princípios de 1882, o município cearense de Acarape alforriou todos os seus
escravos, demonstrando a repulsa da província ao cultivo delituoso da servidão
humana. Depois de Acarape, São Francisco e Pacatuba fizeram o mesmo. Depois do
exemplo de Sobral, libertando, espontaneamente, cento e dezessete escravos, a
abolição em toda a província do Ceará se fez muito antes do Decreto de Maio de
1888, que declarou extinta a escravidão no País. Conforme verificamos, os
dignos brasileiros do Ceará liquidaram o cativeiro à custa deles mesmos. Não
pediram dinheiro emprestado a ninguém e n em convidaram outras províncias a se
tumultuarem, a fim de acompanhá-los; não pregaram a subversão contra as leis do
Império e nem aconselharam a desordem coletiva, a favor dos ideais da
humanidade em que se inspiravam. Fazendeiros ou não, proprietários ou não, os
nossos irmãos cearense preferiram o próprio sacrifício. Não hesitaram em ferir
os próprios interesses e em diminuir as posses deles mesmos, mas repartiram com
os nossos irmãos cativos, mais do que o pão e as vantagens que lhes pertenciam,
e sim a própria liberdade, ensinando ao Brasil inteiro, sem influencias externas,
que a liberdade de trabalhar para garantir os seus próprios caminhos é um dom
de Deus para todas as criaturas humanas. Creia você que não faço essas
referencias por bajulação ao nobre estado do Ceará, onde a Divina Providência me
concedeu tantos amigos generosos e dedicados, mas porque, em se falando em
entendimento entre comunidades e paz duradoura, não acredito que essas
conquistas venham até nós por medidas de força ou através de movimentos
compulsivos do relho verbal e, sim, à custa de nosso próprio suor, esforço,
diligência e sacrifício, na compreensão e no auxilio de uns para com os outros,
qual aconteceu com os cearenses unidos e livres do cativeiro, muito antes de
surgir na capital do Império o decreto que extinguiu a escravidão em nosso
País.
P – Que mensagem você gostaria de aqui deixar para os
iniciadores da construção do Terceiro Milênio?
- Prezado amigo, se
eu dispusesse de autoridade, rogaria aos homens que estão arquitetando a construção
do Terceiro Milênio, para colocarem no portal da Nova Era as inolvidáveis palavras
de Nosso Senhor Jesus Cristo: “Amai-vos uns aos outros como eu vos amei”.
Fonte:
Livro Chico, de Francisco. Adelino da Silveira. – São Paulo:
Cultura Espírita União, 1987. 159 p.
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